Thursday, January 31, 2008

mr. goffman

mr. goffman, assim gostava de ser chamado na vizinhança, era pujante em seu trabalho delicado de entregar livros pedidos pela internet. se definia judeu e ateu, para evitar discussões religiosas - que geralmente são enfadonhas e costumam cancelar trepadas quase certas.

mr. goffman era zeloso em sua labuta, acordava cedo, colocava o chapéuzinho panamá na cor bege e saía com sua valise repleta de entregas. como um pastor alemão, espreitava e, como uma ratazana em idade pueril, corria pela cidade, atalhando pelos esgotos mais loquazes - por causa das donas de padarias que ali habitavam e engoliam seu orgulho (sobrava para o cônjuge lidar com os cornos e para o amante a lascívia que irritava a pele ardente da glande).

para a refeição segunda ajeitava-se em cima de quatro exemplares carcomidos de updike (não serve para muito mais além disso) enquanto retirava do saquinho de papel torpa três salgados azedos e porosos que fazia questão de engolir rápido, mesmo sabendo que a azia seria vingativa em relação a ato tão libidinoso - o barroco tá aí para isso e não se pode fazer nada.

o cochilo vespertino se dava na sombra proporcionada por uma macieira mal plantada. carcoma para todos os lados, inclusive em um exemplar de capa azul de hemingway - sabe-se lá qual -, tudo virando farinha. farinha? farinha. mais alguma coisa? para que tantas frases curtas? gostamos de excesso, ejaculação depois de três minutos minutados em relógio de grande porte, não desses encontrados na 25 de maio mas daqueles que se compra e, se roubado, deseja-se logo mandar o individuo caminhar em direção a doce e putrefata progenitora, sem direito a recurso, vara nenhuma aceita isso e, se aceitar, que também se dirijam para orifícios oriundos de cavidades do blastóporo - entendeu? não dá para fazer mais nada por você, melhor parar por aqui antes que seja tarde e seu cérebro (e quem sabe sua alma) já não mais lhe pertençam.

acordava sobressaltado, coberto de plumas e sêmen de aranhas (calma!, inofensivas). mas depois de falar de secreções não seria digno continuar esse parágrafo.

guardava uma foto da jennifer connelly na carteira, mas, com toda sinceridade, isso nem vem ao caso.

mr. goffman sonhava em ser piloto. foda-se.

mr. goffman chegava em casa desejoso. sua esposa, vicky (pedia para ser chamada assim), tinha um corpo bonitinho, peitinho arrebitado, glúteos bem recortados, mas um tapete seria mais lascivo. mr. goffman se aproximava lentamente, com expressões que a maioria das pessoas pensaria ser início de um ataque cardíaco mas que para ele significava apetite sexual - respeitem, ora pois. e tal qual o evangelho de são joão, se arrendava todo fantasioso na expectativa de uma lambidinha ao menos. e nessa hora é impossível não conter o riso. antigo militante do partido comunista se limitava a conter uma certa efusividade que explodiria no vaso sanitário. as calças a meia altura, de meias de algodão, equilibrava-se em seu vazio patético. podem rir ou chorar, o palanque está em abertura, rasputins unidos. what a shame, mr goffman, what a shame! no obsoleto toca-fitas do quarto janis joplin em cassete mofado, em intensidade mediana. pensar em clemência seria o mínimo. uni-vos! (já com o terço na mão, segundo mistério da fé).

regurgitando até o talo aquele velho toddynho que morava na geladeira há anos

eu adoro ficar de frente para a tela do computador pensando que nada tenho para fazer enquanto os carros passam a três andares abaixo de mim. e as pessoas ficam nervosas no trânsito, reclamam que a cidade está difícil quando na verdade posso deitar na minha cama e ficar vendo televisão o dia inteiro mudando do shoptime para os clipes de mulheres semi-nuas do multishow, pois a programação noturna é boa para se ver junto de um pacotinho de ruffles e ao som de alguma das cantatas bachianas ao mesmo tempo em que fico acendendo e apagando um charuto comprado no comércio negro de são paulo e basta olhar para o teto para perceber formiguinhas prontas para engolir a fiação toda do condomínio residencial, quiçá da rua toda, na medida em que são tormentos pequenos para as pessoas que precisam do trânsito para reclamar da valoração mínima de suas vidinhas boçais: aí vem o professorzinho de francês parler avec moi, respondo em inglês que é para não ter que falar mais e ele sai girando pelo corredor sendo que o melhor de tudo é poder andar de meia no chão sujo da sala (as férias da faxineira trazem duas consequências: alto consumo de bebidas alcóolicas - com o que economizo - e pó, muito pó, cerca de 1 metro cúbico que se espalha da cozinha ao interior transeunte do armário onde outrora morava eusébio, aspirante a comunista e refugiado de manchester) para presenciar calcinhas penduradas na janela, que são sinal de excesso, desconfio sempre dessas atitudes simplistas que, na verdade, carregam em seu limite tênue, a ação de quem gosta de joguetes sexuais com estranhos (o mesmo vale para seres que não comem carnes, ovos e manteiga); na melhor das hipóteses a televisão me informa sobre o tempo, se vai chover, sei que alguma dona camila vai bater o seu celta prata em algum monza 88 de senhor prudêncio e haja bate boca, pois a humanidade vende um pé para poder gritar e, se necessário, decepa logo orgãos de suma importância para poder iniciar um pugilato, e de luta livre eu prefiro os confrontos finais do ultimate fight: dá-lhe minotauro!

Tuesday, January 15, 2008

aprendiz de boxeador

eu sou o operário da inalação presbítera, do sofismo da pureza, da nobreza de achar que galhardia é sinônimo de comportamento exemplar. engendrado o conhecimento episcopal, pistola maluca na qual os dedos no gatilho não passam de farinha que se derrama tal qual são derramadas as lágrimas do menino que se encontra preso no armário. o suor que escorre pela testa é fino, frio enquanto adormece alguns músculos ao mesmo instante em que os outros se contraem na excitação do pré-ocorrido. insulflam tentativas de calmaria ao redor do escuro e sujo alojamento de ratos, baratas e chuveiros de temperatura única. encolhido no canto, bicho do mato insolúvel, açúcar que não se derrete, emerge, solução supra-real, super saturada, isotônico impossível e vagabundo, não há fora de quadro, tudo pode ser visto, exposto ao público, lente aberta para o mundo. sincopada e hermética a respiração, a admiração estóica de quem quer pagar para ver e verá que um minuto é um tempo mensurável apenas para os olhos de quem está de fora. a circulação sangüínea de sessenta segundos é algo latente, dói e pronuncia que o pior está por vir. uma manada inteira pisoteando-me, aniquilando-me, zombando-me, gozando-me, querendo-me. romaria de gritos, balelas de jornais de tout le monde, gama de esferas de aço, luzes azuis, grenás e douradas, tapete vermelho jogado, tudo visto de cabeça para baixo, fora-de-foquismo esclarecido, o branco invade o cenário, não há mais tempo, em setenta e um longos segundos tudo estava resolvido.

Thursday, January 03, 2008

bobagens

Peça por peça, recolhidas uma a uma, colocadas em caixas, localizadas ao longo do longo sofá, beirando fragmentos de vida. Quebra-cabeça dinâmico, como os carros que atravessam a metálica avenida, em busca de casa, across the universe. A cidade é uma lata de palmitos, espremidos, molhados, devorados por alguém que nem sequer conhecemos. É como se Ramones fosse Beatles e Hemingway fosse Proust. Ou perdemos um dedo ou então somos internados para cirurgia de apêndice. E dói só de pensar, o bisturi que hoje te opera amanhã corta mais gente e lá se vão peles para museus de arte moderna, vendidos a preço baratinho. Na contramão da história estão aqueles que querem mudar o mundo, querem mudanças porque sabem que não conseguem abrir uma lata de pêssego. Não temos o abridor e o alicate pode ser perigoso se manuseado sem prescrições médicas. Internamente nossos órgãos em festa rave. O exôfago não perde um episódio de Two and a half men por acreditar naquele estilo de vida. Cabeça, corpo, membros e membro. Usurpamos nossa personalidade porque desejamos a moça da novela, mas, na falta dela, serve a vizinha do andar de cima do prédio do lado. Janela indiscreta sem emoção, torcemos para o morto aparecer, mas ele escorre até cair e nós o perdemos de vista. My mind is blind, curso de inglês fajuto e burocrático, todo mundo adora falar o saxão, por que é rápido, meu caro? ágil você hein? E quando pensamos que já descobrimos tudo, percebemos que a vodka acabou e é hora de comprar mais. Mas fica para amanhã, as pecinhas já estão in the box, como eles gostam de dizer.